Um dos princípios estabelecidos na Lei de Licitações e Contratos é o da impessoalidade. Dentre outras coisas, este mandamento determina que todos os licitantes em igualdade de condições sejam tratados da mesma forma, que nenhum seja favorecido ou prejudicado dolosamente. Dessa forma, havendo uma competição em igualdade de condições, a princípio a proposta vencedora será, a priori, a melhor para a administração pública.
Na prática, algumas peculiaridades devem ser consideradas na elaboração do edital, mesmo sabendo-se que o responsável por sua confecção pode determinar o tipo a ser utilizado (“melhor técnica”, “menor preço” ou “melhor técnica e preço”).
Como exemplo, pode-se citar a compra de canetas: se a administração optar pelo tipo “menor preço”, aparecerão licitantes oferecendo canetas de baixíssima qualidade, daquelas que usa-se por uma semana (quando chegam a isso) e começam a falhar, etc. A “melhor técnica” normalmente é cabível na escolha de projetos, serviços, etc. Assim, há uma sinuca de bico: como comprar uma caneta de qualidade superior (bic, por exemplo) se não é possível ser feita a escolha pela marca nas licitações (há vedação expressa, uma vez que frustraria o caráter competitivo, limitando somente àquele fornecedor)? A solução adotada, em boa parte dos casos, consiste em formatar o edital de forma que o produto tenha as especificações desejadas, tomando-se cuidado para não limitar o número de participantes (o que acaba por acontecer). No caso em tela, o projeto básico contemplaria canetas com um orifício circular no meio do corpo (respiradouro), contendo carga capaz de escrever x palavras (características da BIC)...
Bem, o caso supracitado corresponde a uma situação em que se buscam produtos de qualidade para a administração pública. Entretanto, verifica-se que não são raras as situações em que os editais são montados para beneficiar determinada empresa ou marca, excluindo as demais. E por incrível que pareça, em alguns desses casos concretos, NÃO SÃO IMPETRADOS RECURSOS. Combina-se com os licitantes que haverá rodízio dos vencedores para acalmar os ânimos...
As sugestões para coibir essas práticas são:
• Diante da possibilidade do edital restringir o caráter competitivo, podem ser impetrados recursos administrativos ou judiciais. Na pior das hipóteses, se forem ineficazes pelo menos protelarão (atrapalharão) o certame;
• Dependendo da esfera (federal, estadual ou municipal), há regulamentações específicas de cada Tribunal de Contas. Na maior parte dos casos, há a necessidade dos editais serem encaminhados previamente para análise ou registro por parte do corpo técnico (controle prévio). Dessa forma, se a Corte de Contas reprovar ou recomendar ajustes, ok. Se aprovar, cabe pedido de reexame;
• O Ministério Público, conforme mencionado, é o Fiscal da Lei. Uma denúncia dessa natureza dará início a um procedimento preparatório e será certamente investigado pelos Promotores de Justiça; e,
• A divulgação da notícia na imprensa costuma trazer bons resultados, mormente em função do custo político gerado (desgaste junto à opinião pública).
Para fins de análise, podem ser solicitados, ainda:
- Cópia do procedimento licitatório onde constem as propostas e outras onde figurem pelo menos uma dessas entidades, a fim de que seja verificado: similitudes no preenchimento das propostas, tais como estilo de redação de semelhantes (evidenciando terem sido as propostas feitas pela mesma pessoa) e assinaturas (a conferência pode ser realizada exame grafotécnico), empresas convidadas (a fim de seja verificado se há rodízio de vencedores e se, a cada novo certame, é convidada pelo menos uma empresa diferente), proximidade dos valores apresentados (previamente combinados), se todos os representantes comparecem `a abertura dos envelopes (geralmente só comparece a empresa vencedora, previamente combinado), se os sócios/quotistas de uma empresa participa da(s) outra(s) ou se são servidores ou parentes destes;
- Rol de empenhos, NL (notas de liquidação) e OP (ordens de pagamento) feitas em nome das empresas suspeitas;
- Verificar se as empresas concorrentes realmente existem. Entidades-fantasmas criadas apenas para fins de serem “concorrentes” em processos licitatórios normalmente não existem de fato no endereço demonstrado na documentação.