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26/02/2008 - Jornal de Negócios
Quem engana os investidores?
Por: Pedro Santos Guerreiro
A CMVM adoraria que toda a informação de mercados fosse regrada, proferida de forma ajuizada, compassada a um ritmo celestial que embalasse a Bolsa. Esse seria o mundo da informação pura e alva. Que não existe. A Bolsa é um território habitado por tubarões e peixinhos em águas de PH muito ácido.
Foi assim que há cinco anos a CMVM desenformou um Código de Transparência que propunha várias convulsões. Hoje parece pré-história mas foi só em 2003 que se avançou para a divulgação dos honorários pagos aos auditores e das remunerações das administrações; para a obrigatoriedade de manter um sítio na Internet com informações sobre a empresa e para alistar administradores independentes que velassem pelas boas práticas.
Cinco anos depois, é impressionante ver quão atrasados estávamos numas coisas. E quão retrógrados permanecemos noutras.
O maior dos fracassos está no governo de sociedades, remetido a galerias de notáveis domesticados e irrelevantes. Criaram-se estruturas sem motivação para a mudança, apenas para o marketing, que se mostraram amestradas e passivas perante conflitos internos. Estenderam-se as cadeias de controlo do poder por mais camadas. Os administradores independentes são-no pouco e continua a não haver qualquer estrutura com força de representação dos pequenos accionistas
A CMVM é o último reduto e é justo reconhecer que a Comissão tem hoje voz muito mais grossa. Há cinco anos, as primeiras contra-ordenações a empresas cotadas eram provocações iniciáticas de um regulador que mostrava medo dos regulados. Hoje, as empresas cotadas queixam-se do activismo epidérmico de Carlos Tavares, que colhe e tolhe em qualquer declaração inexacta ou precipitada. Nos últimos dois anos, só em matéria de prestação de informação, foram cobradas multas superiores a um milhão de euros à EDP, PT e Inapa.
Mas a CMVM quer mais e acaba de pôr à discussão um documento sobre Abusos de Mercado, a que o Jornal de Negócios está a dar amplo debate diário. Incluindo o papel do jornalismo financeiro, consultado por 40% dos investidores na sua tomada de decisão.
Embora a posição da CMVM corra o risco de parecer moralizadora e recomende coisas impraticáveis (ver páginas 26 a 29 desta edição), os jornais precisam de pôr a mão na consciência e rever as falsas OPA que anunciaram ou os investimentos e desinvestimentos noticiados que nunca se realizaram. As OPA à PT e ao BPI tiveram contra-OPA estéreis, a delirante OPA ao Benfica até sombras chinesas teve, o inimputável Joe Berardo tornou-se "best seller" de primeiras páginas, a tragédia do BCP acomodou tendências certas e o seu contrário.
O assunto é sério: os portugueses ganham e perdem dinheiro por causa disto. No último trimestre de 2007, pediram 600 milhões de euros à banca para investir na Bolsa. As acções já caíram 15% desde então.
No mundo perfeito da CMVM, toda a informação chega aos investidores ao mesmo tempo, não há rumores nem intenções, apenas transparência e fiabilidade, órgãos que previnem abusos e jornalistas que dançam a valsa. Esse é o mundo com que Carlos Tavares sonha. Quando acorda, estatela-se na constatação de que está rodeado de maus rapazes.
E os jornais? A CMVM tem o mérito de reabrir a discussão e obrigar os jornais a reconhecer que há problemas mas falhará todas as tentativas de purificação das redacções. Esse poder está exclusivamente reservado aos leitores, que avaliam quem lhes fornece informação de qualidade e quem é instrumentalizado para mexer nas cotações ao abrigo da confidencialidade das fontes. O capitalismo popular é uma estradas com dois sentidos.
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